sábado, 16 de maio de 2015

Alta Fidelidade (High Fidelity, 2000)

Para Kíssila

Todos nós já tivemos (ou teremos) desilusões amorosas em algum momento de nossas vidas. Não considero isso um pensamento pessimista – apenas algo natural e comumente doloroso, cujo sofrimento é, todavia, necessário para nos tornar pessoas mais maduras e fortes, pois sempre aprendemos melhor através dos erros que nós mesmos cometemos, afinal somos teimosos a ponto de ignorar a tentativa e erro de outrem.


Infelizmente, este não é caso de Rob Gordon (John Cusack), o protagonista da comédia dramática Alta Fidelidade, lançada em 2000 e dirigida por Stephen Frears. Rob é o tipo de homem que parece não ter aprendido nada com seus relacionamentos anteriores, culminando no rompimento de mais um, desta vez com Laura (Iben Hjejle), parceira de longa data. Enquanto a transição final não ocorre (Laura vai aos poucos transferindo suas coisas pessoais para seu novo lar), Rob passa a se abrir para o espectador, quebrando a quarta parede constantemente para nos revelar seu Top 5 de desilusões amorosas, em ordem cronológica. Ao perceber que não está pronto para desistir de Laura, nosso anti-herói resolve entrar em contato com suas antigas namoradas a fim de tentar entender onde tudo deu errado.

Amante incondicional de Música, Rob já foi DJ e possui uma imensa coleção de discos em seu apartamento, além de ser dono de uma loja que vende estes mesmos itens. Ou deveria, pois ele e seus empregados Dick (Todd Louiso) e Barry (um ainda não tão conhecido Jack Black) não hesitam em maltratar clientes com conhecimento ocasional ou “gosto duvidoso” por Música – a 1ª Arte se faz tão presente na vida do protagonista que ele chega a reorganizar sua vasta coleção em ordem “autobiográfica”, ou seja, cronologicamente de acordo com o qual aquelas canções e álbuns marcaram sua vida, além da tendência em criar um Top 5 para tudo, mesmo para o que não tem ligação com a Música (ao menos do ponto de vista do espectador).

Enquanto Rob não tem quaisquer perspectivas para o futuro, Laura trabalha em uma firma de advocacia da qual gosta e sempre pensa adiante. Ela possui carro próprio, enquanto ele se locomove de metrô e sobrevive mês após mês com o lucro quase inexistente gerado pela loja. Ela sempre torceu por Rob, mas o próprio nunca deu o primeiro passo em busca de seus sonhos. Ele a negligenciava e a si mesmo. É claro que um relacionamento como este estava fadado ao fracasso.

Entretanto, à medida que Rob revisita seu passado e os motivos de seus fracassos prévios, o mesmo começa a ter ciência de suas limitações e imperfeições, do fato de ter passado os últimos vinte anos ainda preso à adolescência e, mais importante, do motivo de ter sido abandonado por Laura – esta, diga-se de passagem, é uma personagem com a qual podemos facilmente nos identificar, pois aceitamos suas atitudes sem ao menos questioná-las. Enquanto acompanhamos o desabafo de Rob durante todo o filme e acabamos simpatizando por sua causa, também sabemos que Laura merece uma pessoa melhor, ou um Rob amadurecido e menos egoísta.

O ótimo roteiro e seu humor inteligente foram concebidos por D.V. DeVincentis, Steve Pink, Scott Rosenberg e o próprio John Cusack a partir do livro homônimo do escritor Nick Hornby, publicado cinco anos antes. A trilha sonora cuidadosamente selecionada dentre 2.000 canções desfila variados estilos de Música, sobretudo Rock, com artistas como Elton John, The Kinks, Joan Jett & The Blackhearts, Bruce Springsteen (inclusive aparecendo em pessoa em uma ponta), Belle & Sebastian, Bob Dylan, Grand Funk Railroad, Love e The Velvet Underground.

O elenco é eficiente: era preciso um ator simpático para interpretar o aborrecido e imaturo Rob, e Cusack foi uma escolha certeira. O mesmo pode ser dito sobre Iben Hjejle, bastante agradável como Laura. Sou suspeito para falar sobre Jack Black, pois sempre o admirei como comediante e músico, e foi como o personagem Barry que Black revelou ao mundo sua veia cômica e talento ao microfone. Todd Louiso e Sara Gilbert expressam bem toda a esquisitice de Dick e Annaugh, respectivamente. Temos ainda participações menores como a de Joan Cusack (irmã de John, e suponho que no filme seja irmã de Rob) como Liz, Catherine Zeta-Jones (além de linda, não compromete aqui) como Charlie, uma das ex-namoradas de Rob, e – a melhor de todas – Tim Robbins como Ian (dar detalhes sobre seu personagem estragaria parte da experiência em assistir ao filme, mas devo dizer que a cena na qual ele visita a loja de Rob é hilária por diversos motivos).

Alta Fidelidade é, sobretudo, vitorioso em seu próprio título. É um filme sobre personagens tridimensionais para pessoas com emoções reais. Não deve ser visto durante uma dor-de-cotovelo, pois pode dar um nó em sua garganta em alguns momentos...

Pensando melhor, veja de qualquer forma. Você só tem a ganhar.

Nota: *****

Um comentário:

  1. Gostei do que li. Assistirei.

    Ps: Enxerguei um Pedro do passado nessas linhas.

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